Notícia: Coronavírus: como lavar as mãos quando 10,5 milhões de domicílios não têm água tratada?

Coronavírus: como lavar as mãos quando 10,5 milhões de domicílios não têm água tratada?

Debate desta terça-feira (29/09) analisa o cenário do saneamento básico no Brasil e os desafios que foram intensificados pelo contexto da pandemia

Lavar as mãos é uma das principais recomendações das autoridades de saúde para conter a disseminação do novo coronavírus. No entanto, cerca de 10,5 milhões de domicílios brasileiros (14,5%) não contam com rede de distribuição de água tratada como principal fonte de abastecimento, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2019. Quando o assunto é esgoto, o cenário também é precário: quase um terço das casas não estão ligadas à rede geral de esgotamento sanitário, segundo dados da Pnad.

Imagem de uma estrada de barro, enlameada e com duas crianças no centro. Uma é um menino e está sentado no barro e outra é uma menina de uns 3 anos, negra e em pé

O Debate desta terça-feira (29/09) analisa o cenário do saneamento básico no Brasil e discute os impactos da falta de acesso para populações mais vulneráveis e crianças em idade escolar.

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O apresentador Bernardo Menezes conversou com Alceu Guérios Bittencourt, presidente nacional da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), e com a Ana Lúcia Britto, coordenadora de projetos do Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (Ondas), sobre os desafios enfrentados pelos consumidores e pelo setor do saneamento básico no Brasil, além dos impactos do novo Marco Legal do Saneamento, sancionado em julho deste ano.

Para falar sobre as consequências do saneamento precário para escolas no cenário de retorno às aulas presenciais, a equipe do Debate conversou com a professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Juliana Scriptore e com a coordenadora do Unicef na Amazônia Anyoli Sanabria.

Essa edição do Debate também mostra algumas iniciativas que tentam melhorar o cenário do saneamento básico em suas áreas de atuação. Para isso, o programa traz depoimentos do Breno Henrique, coordenador do CocôZap, projeto que busca mapear os problemas de saneamento do Complexo da Maré (RJ), e da Fernanda Deister, coordenadora dos Engenheiros Sem Fronteiras Brasil, que têm desenvolvido algumas ações para promover o acesso à água nesse contexto de pandemia.

Qual é o cenário do saneamento no Brasil?

Apesar do número considerável de domicílios em que a rede geral de distribuição de água não é a principal forma de abastecimento, 85% das residências têm acesso a essa rede de água tratada, de acordo com a Pnad. No entanto, em muitos municípios, esse abastecimento não é contínuo, com números de quase 45% de interrupções e mais de 20% de racionamento de água, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico do IBGE.

Imagem de uma menina branca agachada e de costas para quem bateu a foto. A menina está de frente para um rio, onde nada um pequeno jacaré
O acesso à água limpa e ao saneamento básico é um direito humano essencial, de acordo com resolução da Organização das Nações Unidas (ONU). (Foto: AFP)

Quando o assunto é esgoto, a desigualdade também é nítida entre as regiões do país: enquanto quase 90% dos domicílios da região Sudeste estão conectados à rede geral de esgotos, os números da região Norte não chegam a 30%, de acordo com dados da Pnad.

Essa desigualdade contraria a resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) que, há dez anos, determinou o acesso à água limpa e ao saneamento básico como um direito humano essencial. A professora Ana Lúcia Britto explica que esse direito tem alguns princípios, sendo o principal aquele que indica que todos devem ter acesso à água e ao esgotamento sanitário, financeiramente acessível, de qualidade, sem qualquer discriminação. “Um outro princípio central desse direito é que ele obriga os Estados a eliminarem progressivamente todas as desigualdades de acesso, tanto à água quanto ao esgotamento sanitário”, ressalta a coordenadora do Ondas.

Imagem de uma mulher na casa dos 50 anos, de cabelo solto e castanho escuro
A professora Ana Lúcia Britto explica que o acesso à água limpa e ao saneamento básico é um direito humano essencial, de acordo com resolução da ONU (Foto: Acervo Pessoal).

Para o presidente da Abes, Alceu Guérios Bittencourt, o Brasil tem muitos contrastes quando o assunto é saneamento básico. “Se por um lado o país teve muitos avanços, com um setor institucionalizado que consegue atender grande parte da população, a partir da cobrança de tarifas, por outro, temos déficits que estão nas áreas mais difíceis de atender. Normalmente, esses desafios estão nos municípios de pequeno porte, de pouca viabilidade econômica, e nas periferias das grandes cidades, em que o saneamento implica não só uma questão setorial, mas uma questão urbana e de habitação”, explica o especialista.

É nesse cenário complexo que foi sancionado, em julho deste ano, o novo Marco Legal do Saneamento Básico. A nova lei altera o Marco anterior, criado em 2007, e prevê que até o fim do ano de 2033 99% da população brasileira terá acesso à água potável e 90% à rede de coleta e tratamento de esgoto. Uma outra mudança é a obrigatoriedade de abertura de licitação para a prestação dos serviços de saneamento, com a participação de empresas públicas e privadas, e sem preferência para as companhias estaduais.

Um homem branco, calvo, de camisa social de mangas compridas e na cor azul, está sentado com as duas mãos sobre a mesa à sua frente
O presidente da Abes, Alceu Guérios Bittencourt, afirma que o Brasil tem muitos contrastes quando o assunto é saneamento básico. (Foto: Acervo Pessoal)

A coordenadora do Ondas explica ao Debate que há uma ideia de que o novo Marco Legal ampliaria a participação privada e esses prestadores privados aportariam recursos para o setor. “No entanto, se nós analisarmos a história da prestação privada no Brasil, nos últimos anos, percebemos que o setor não costuma aportar muitos recursos próprios, mas mobilizar recursos dos fundos públicos”, destaca Ana Lúcia Britto. O presidente da Abes acrescenta que tem receio de que se desmanchem arranjos que funcionam bem em muitos aspectos. “

Saneamento nas escolas e a volta às aulas

Mais de 52 milhões de estudantes brasileiros continuam sem aulas devido à pandemia do novo coronavírus, segundo dados da Unesco. Contudo, nos últimos meses, as discussões sobre o retorno às aulas presenciais se intensificaram e, com elas, surgiram questionamentos a respeito da infraestrutura das instituições de ensino.

De acordo com levantamento do Unicef e da Organização Mundial da Saúde, 16 milhões  de alunos brasileiros não contam com a estrutura básica de água e sabão para lavagem das mãos nas escolas. Além disso, 6 milhões de crianças frequentam estabelecimentos de ensino sem acesso à água tratada e 2 milhões não têm serviço de saneamento na escola, segundo o mesmo levantamento.

imagem de uma pessoa branca com as mangas da blusa arregaçadas e lavando as mãos em uma pia
Volta às aulas: 16 milhões de alunos brasileiros não contam com a estrutura básica de água e sabão para lavagem das mãos nas escolas. (Foto: AFP)

“Para o Unicef e para o resto do mundo, condições de água e saneamento, sobretudo para a lavagem de mãos nas escolas, são fundamentais para pensar no retorno às aulas presenciais”, ressalta Anyoli Sanabria. A coordenadora do Unicef na Amazônia explica ao Debate que o órgão tem insistido na importância de uma análise criteriosa por parte dos estados e municípios, para garantir uma boa preparação para o retorno às escolas.

O Debate também conversou com a professora Juliana Scriptore, autora da tese de doutorado “Impactos do saneamento sobre saúde e educação”. Para ela, “ao se discutir a possibilidade de retorno às aulas presenciais, é importante destacar que ter saneamento básico é segurança primordial para alunos, professores e funcionários”.

Uma mulher branca, de cabelos pretos e soltos está falando com quem bateu a foto
A professora doutora Juliana Scriptore afirma que as pessoas mais suscetíveis às doenças infectocontagiosas relacionadas ao saneamento precário são as crianças. (Foto: Acervo Pessoal)

A especialista acrescenta que as pessoas mais suscetíveis às doenças infectocontagiosas relacionadas ao saneamento precário são as crianças. “As complicações associadas a essas doenças comprometem a função cognitiva das crianças, e também o comportamento relacionado à capacidade de atenção e concentração. Tudo isso dificulta o aprendizado e impacta o desenvolvimento escolar”, alerta Scriptore.

Assista ao Debate sobre Doenças Negligenciadas

Algumas iniciativas

Uma outra desigualdade no acesso ao saneamento básico diz respeito ao destino final do esgoto. De acordo com a Pnad, mais de 12% dos domicílios brasileiros ainda têm como destino dos dejetos o próprio terreno, as valas, rios, lagos e o mar. Esta é uma realidade muito comum no Complexo de Favelas da Maré, no Rio de Janeiro, e que levou o  , um laboratório de dados da região, a criar o projeto “CocôZap”.

O Debate conversou com o Breno Henrique, coordenador da iniciativa, que tem por objetivo mapear os problemas de saneamento do território, a partir de imagens enviadas pelos próprios moradores, pelo WhatsApp. “Com esses dados, nós conseguimos produzir nossas próprias narrativas, porque nós entendemos que a produção de dados é muito importante em um universo em que a prefeitura não mapeia nesse nível. O nosso grande objetivo é ter um banco de dados robusto, para conseguir pautar as políticas públicas”, explica o jovem, que também é oceanógrafo.

Imagem de um jovem rapaz branco de bandana branca nos cabelos volumosos, cacheados e castanhos
Breno Henrique é um dos criadores do CocôZap, uma iniciativa que tem por objetivo mapear os problemas de saneamento no complexo de favelas da Maré, a partir de imagens enviadas pelos próprios moradores. (Foto: Acervo Pessoal)

A iniciativa Engenheiros Sem Fronteiras também tem trabalhado em ações de combate ao novo coronavírus. Foram desenvolvidos projetos assistenciais voltados para produção de máscaras, álcool 70, escudos faciais para hospitais e outros insumos necessários ao enfrentamento da Covid-19.

No que diz respeito ao acesso à água, a organização construiu lavatórios em diversas comunidades do Brasil, para que os moradores pudessem higienizar as mãos. “Nós vemos o saneamento como um direito, como uma ferramenta muito importante para a redução das desigualdades, e nós acreditamos que o terceiro setor tem um papel muito importante nisso, porque nós vemos que comunidades e pequenos municípios são negligenciados pelas políticas públicas”, explica a coordenadora do projeto no Brasil Fernanda Deister, em entrevista ao Debate.

Imagem de uma jovem menina branca, sorridente, de óculos de grau e cabelos soltos. Ela esta de blusa branca com a logo do Engenheiros sem Fronteira
Fernanda Deister é coordenadora do Engenheiros sem Fronteiras, iniciativa que desenvolveu projetos assistenciais voltados para produção de máscaras, álcool 70 e outros insumos necessários ao enfrentamento da Covid-19. (Foto: Acervo Pessoal)

Você confere essas temáticas no Debate apresentado por Bernardo Menezes, nesta terça-feira (29/09), às 21h, nas telas do Canal Futura, e disponível também no Futura Play.

 

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