FRM e Timor-Leste: 20 anos de cooperação
Compartilhar
Em outubro de 1999, Renato Mattarelli, então gerente de Teleducação da Fundação Roberto Marinho, leu em uma matéria do jornal O Globo sobre o conturbado momento por que passava um território na Ásia em que se falava a língua portuguesa - o Timor-Leste.
Hoje um Estado-nação, o país, situado no sudeste asiático, corresponde a metade da ilha de Timor (Timor Ocidental é a província indonésia que ocupa sua outra metade). O Timor-Leste tem sua língua nativa - a tétum -, mas foi colonizado por Portugal, assim como o Brasil, passando a falar, também, o português. Em 1975, foi ocupado pela Indonésia, que enfrentou a resistência da população local pelos 25 anos seguintes. Em agosto de 99, por meio de um plebiscito popular, os timorenses optaram por sua independência.
Após um turbulento e sangrento mês de setembro, com invasões e massacres de milícias apoiadas pelo Exército da Indonésia, a intervenção de uma força multinacional organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU) fez com que os militares indonésios se retirassem.
Na reportagem lida por Renato, líderes timorenses manifestavam o desejo de que o Brasil pudesse ajudar no processo de reintrodução da língua portuguesa no país - praticamente banida durante a ocupação indonésia.
José Roberto Marinho, diretor-geral da FRM à época, deu início, então, ao processo para que a Fundação colaborasse com a reconstrução do sistema educacional do Timor-Leste. Como pilar dessa cooperação, a experiência de 22 anos que a casa possuía por meio dos diversos projetos educacionais implementados no Brasil - notadamente, o Telecurso.
O Telecurso chega ao Timor-Leste
Entre o final de 1999 e início de 2000, líderes timorenses entenderam que a Metodologia do Telecurso lhes seria útil no processo de reconstrução da educação de seu país. O uso de materiais pedagógicos do Telecurso, voltados para a Educação de Jovens e Adultos (EJA), além do devido acompanhamento pedagógico da FRM, mostrou-se bastante adequado ao cenário desafiador do novo país asiático.
No último trimestre de 2000, os primeiros educadores do Timor-Leste chegaram ao Brasil para participar das formações do Telecurso. O encontro entre educadoras e educadores timorenses e brasileiros permitiu que todas e todos reconhecessem terrenos comuns em suas próprias identidades culturais, a despeito da enorme distância geográfica.
Por todo o ano de 2001, formações pedagógicas na Metdologia Telessala aconteceram também no Timor-Leste, possibilitando melhor adequação aos contextos e realidades locais.
Era a primeira vez da Metodologia Telessala além das fronteiras brasileiras!
“Foi a possibilidade de a FRM colocar a sua expertise e os seus projetos educacionais a serviço da solidariedade e da luta de um povo para manter a sua cultura e identidade”, disse Renato Mattarelli. Tudo isso aconteceu por meio de encontros e reuniões envolvendo educadores e alunos, com visitas a possíveis locais de implementação de telessalas.
Globo Ecologia
Em 2002, a Fundação Roberto Marinho atuou como mediadora junto à Agência Brasileira de Cooperação (ABC) e à Administração Transitória do Timor-Leste (UNTAET - missão provisória de gestão de governo organizada pela ONU, a partir da saída da Indonésia) para a realização de uma série de televisão sobre a história do país: Timor-Leste - a independência. Composta de 4 episódios, abordava a luta e o processo de reconstrução timorenses com ênfase ecológica e ambiental.
Para Renato, "a realização da série 'Timor Leste – a independência' contribuiu para o resgate de importantes registros históricos, culturais e ambientais para as futuras gerações timorenses".
Passos seguintes
Em 2004, a Fundação Roberto Marinho retornou ao Timor-Leste para realizar uma avaliação do trabalho feito por lá. Foram registradas 11 telessalas em funcionamento, totalizando quase 300 estudantes frequentando as aulas regularmente.
Nesse período, um plano de ação e metas foi apresentado à FRM. Com estratégias e planejamentos que previam compromissos e atividades até 2009, o documento tratava, dentre outros assuntos, da implementação de um sistema de Educação a Distância (EAD) para os timorenses. Àquela altura, o Telecurso Timor era a única ação efetiva (e ativa) de EAD no país.
Marcio Motokane, supervisor artístico da Fundação, esteve no Timor-Leste em novembro de 2010. Acompanhado de Arlecia Duarte, coordenadora de operações da FRM, ambos fizeram parte da equipe dedicada a mais uma etapa do programa de cooperação. O objetivo era produzir 10 matérias jornalísticas e 10 interprogramas para serem exibidos na televisão.
Foi um trabalho que envolveu muitas horas de dedicação e organização de toda a equipe para a obtenção de um material com qualidade.
Marcio Motokane, supervisor artístico da Fundação Roberto Marinho
Timor-Leste: memória e luta
Neste momento, em 2022, com uma população de 1,3 milhão de pessoas, disputas internas pelo poder e alto nível de pobreza - 133º colocado no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) -, a República Democrática de Timor-Leste chega aos 20 anos de sua independência presenciando o retorno de um dos líderes do movimento de 10 anos atrás - e vencedor do Prêmio Nobel da Paz - à presidência do país: José Ramos-Horta.
Para Renato Mattarelli, que lançou, este ano, o livro "Timor-Leste - revisitando os 20 anos do nascimento de uma nação", onde conta em detalhes a sua experiência (algumas delas, compartilhadas nesta matéria), o que motivou a criação da publicação é bem objetivo: manter a memória viva.
O sentido maior de efetuar a publicação desse registro é o de revisitar os 20 anos do nascimento de uma nação e contribuir para que um acontecimento marcante, como foi a luta dos timorenses pela liberdade e pela independência, não caia no esquecimento.
Renato Mattarelli
"O homem, como um ser histórico, inserido num permanente movimento de procura, faz e refaz constantemente o seu saber."
Paulo Freire, em seu livro "Educação como prática da liberdade".