Notícia: “Acredito que a educação científica forma cidadãos conscientes do papel da ciência na sociedade”

“Acredito que a educação científica forma cidadãos conscientes do papel da ciência na sociedade”

Óptica com Ciência

Planejar atividades calcadas em investigações científicas, que joguem luz sobre questões e conceitos complexos da Física: esse foi o caminho trilhado pelo professor André Luís Miranda, do 3º ano do Ensino Médio da Escola SEB Dínatos, em Brasília, com seu projeto pedagógico Óptica com Ciência, um dos vencedores do Prêmio Educador Nota 10!

As investigações que André trabalhou com as(os) estudantes seguiram sequências didáticas dispostas em 3 etapas, que se repetiam:

  • Investigação;
  • Análise e tratamento de dados;
  • Debate e sistematização.

O objetivo era estudar as características da luz e seu comportamento ao incidir em instrumentos ópticos, como espelhos planos, esféricos e as lentes.

Foto de André, um homem branco, com cavanhaque volumoso, óculos de grau com armação branca, sorridente e cabelo preto, liso e penteado para a direita
O professor André Luís Miranda. (Foto: acervo pessoal)

Futura: Como surgiu a ideia de explorar investigações científicas na Física com estudantes do 3º ano do Ensino Médio, por meio do projeto Óptica com Ciência?

André Luís Miranda: Eu compartilho do incômodo de muitos colegas em relação a como se ensina Ciências, e Física, em particular, no Brasil. Entretanto, até recentemente, não sabia exatamente o que eu poderia fazer para mudar isso. O início da mudança foi o mestrado em ensino de física, muito por conta do meu orientador, Dr. Antony Polito. Com ele aprendi muito! Especialmente, o hábito de pensar mais criticamente em relação ao que é dado, aceito tacitamente ou imposto como correto.

Porém, o período de inflexão no qual minhas concepções (ingênuas, devo dizer) sobre ciências e educação foram mais fortemente abaladas se deu com experiências que tive em centros de pesquisa em física em estado da arte pelo mundo. Estive no Conselho Europeu pela Pesquisa Nuclear (CERN), no Fermilab e no Perimeter Institute entre 2018 e 2019. Essas experiências foram essenciais para esta transformação.

Dali veio a ideia de explorar investigações científicas na Física: além de me convidarem a rever concepções, foram capazes de me fornecer ferramentas suficientes para que eu pudesse ousar, tentar algo muito diferente daquilo que vinha fazendo em sala de aula.

A imagem mostra uma mesa metálica com um pino verde ao centro e dois objetos não identificados e transparentes ao lado do pino
Vivências em sala de aula e fora dela fizeram parte das investigações científicas realizadas pela turma. (Foto: acervo pessoal)

Futura: Espaços fora da sala de aula foram usados?

André Luís: Utilizamos um espaço para trabalhos em grupo com mesas grandes, bem iluminado. Usamos também espaços virtuais para diversas finalidades, entre elas: videoaulas utilizadas na concepção de classe invertida, ponto de encontro em horários extraclasse e organização das atividades e trabalhos das(dos) estudantes.

Futura: Interessante ter falado sobre classe invertida. O que você acha da exploração de modelos híbridos de aprendizagem?

André Luís: Acho mesmo que é um caminho possível e, muitas das vezes, desejável. Consegui isso quando levei para um ambiente remoto as aulas diretivas e puramente expositivas, liberando assim o tempo presencial para realizar atividades mais interessantes e dinâmicas.

“Eu explorei modelos híbridos de aprendizagem a partir de uma demanda muito clara: precisava de mais tempo com minha turma”

Futura: Conteúdos transversais a outros componentes curriculares fizeram parte do trabalho? 

André Luís: Se pensado na concepção mais clássica e comumente entendida do termo “interdisciplinar”, por meio de autores como Hilton Japiassu, por exemplo, o projeto Óptica com Ciência não se enquadra. Isso porque não tínhamos a pretensão de trazer outros componentes curriculares como conteúdos adicionais (ou mesmo estruturais) para a nossa experiência.

No entanto, ao trabalharmos os processos pelos quais as ciências naturais acontecem, exploramos uma abrangência que extrapola o domínio disciplinar da Física. Ao fazer um Ensino de Ciências com Ciências, objetivávamos um ensino integral. Isto é, que se fizessem presentes suas múltiplas dimensões: históricas, filosóficas, empíricas. Nesse sentido, temos que, sim, houve uma transversalidade.

“Compreendo que é preciso buscar, antes, uma abordagem íntegra e genuína”

Imagem do que parece ser uma lista escrita em um papel branco. Há a mão de uma pessoa segurando uma caneta, prestes a escrever no papel e um controle remoto, que parece ser de ar condicionado, em cima do papel
(Foto: acervo pessoal)

Futura: Em tempos de pandemia, por conta do novo coronavírus, que sugestões e dicas você daria para as(os) colegas que se veem diante do desafio de trabalhar a Física de forma remota?

André Luís: O ensino remoto representa uma enorme dificuldade para a realização integral deste projeto. É um problema análogo a fazer ciências remotamente. É preciso explorar, investigar, medir, interagir com o fenômeno a ser estudado. No caso do ensino de ciências, isso é ainda mais grave, no meu ponto de vista. Não podemos prescindir tão cedo dessa interação, sob o risco de destituir o ensino de ciências.

Tenho aproveitado este momento de escolas fechadas para entender e apreender alguns potenciais do ensino remoto que eu não enxergava antes. Refiro-me a ferramentas e dinâmicas que eu não conhecia e que podem vir a compor um bom ensino híbrido no futuro. Além disso, está claro para mim que o ensino como é tradicionalmente pensado é perfeitamente adaptável a um ambiente completamente online.

Para aulas diretivas, predominantemente expositivas e pouco dialógicas, parece-me ser um ambiente bastante profícuo! É claro que se perde estando cada uma(um) na sua casa, principalmente nas dimensões do que deriva do contato social. Mas também se ganha! Tempo, sobretudo. Esta constatação reforça com veemência a minha posição inicial em relação a fazer Ensino de Ciências com Ciências!

“É preciso repensar profundamente nossa prática e, sobretudo, nossos valores enquanto professores de ciências se quisermos ver um futuro sem negacionismo, sem fanatismo”

Sobre o Prêmio Educador Nota 10

O Prêmio Educador Nota 10 foi criado em 1998 pela Fundação Victor Civita que, desde 2014, realiza a premiação em parceria com Abril, Globo e Fundação Roberto Marinho.

Reconhece e valoriza professores da Educação Infantil ao Ensino Médio e também coordenadores pedagógicos e gestores escolares de escolas públicas e privadas de todo o país.

O Prêmio tem o patrocínio da Fundação Lemann, SOMOS Educação e BDO, e o apoio da Nova Escola, Instituto Rodrigo Mendes e Unicef. Desde 2018, o Prêmio Educador Nota 10 é associado ao Global Teacher Prize, prêmio global de Educação.

Ao longo das últimas 22 edições, foram recebidos mais de 75 mil projetos, e foram premiados 241 educadores, entre professores e gestores escolares, que receberam aproximadamente R$ 2,6 milhões.

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