Artigo: A saúde mental entre as juventudes

A saúde mental entre as juventudes

Juventudes, saúde mental e sociedade. Recordo-me de ficar bem impactada ao assistir ao vídeo de uma pré-adolescente de 11 ou 12 anos após tomar a primeira dose da vacina da Covid-19, contando, ao ser entrevistada, para um programa de TV, o quanto se sentia feliz em poder tomar a vacina para que voltasse à escola e finalmente pudesse ter amigues outra vez. A pré-adolescente, emocionada e chorosa, recomenda que todas as pessoas tomem vacina o quanto antes, para que a vida volte ao normal e ela e sues colegas possam se reencontrar e se abraçar novamente.

Ao longo do mês de maio, foi votado e aprovado o projeto de lei que descriminaliza e regulamenta a prática do homeschooling no Brasil. A perspectiva de ensino de crianças em casa por parte da família abriu um debate que tem atravessado múltiplas esferas de diálogo no campo da educação. Dados indicam que durante os períodos mais acirrados da pandemia da Covid-19, entre 2020 e 2021, houve piora significativa da saúde mental entre crianças e adolescentes. A distância da escola impactou a vida cotidiana dessa parcela da população, tornando cada vez mais comum, entre jovens, quadros de depressão, ansiedade, entre outros.

Partindo de uma vivência universitária, posso dizer que para jovens um pouco mais velhes, a distância de um espaço físico de construção de laços afetivos e apoio mútuo também fez imensa falta. Não foram poucas as pessoas queridas que pude ver ao meu redor adoecendo e se sentido insuficientes, incapazes de darem conta de um mundo tão instável e adoecedor.

Foi também na universidade que, há alguns anos, em uma mesa que debatia sobre saúde mental, escutei pela primeira vez a ideia de que 'saúde mental é, antes de tudo, uma expressão de questões sociais mais amplas'. Se estamos adoecides, em muito isso se relaciona com questões contemporâneas de nosso tempo: em uma sociedade capitalista, racista, sexista, lgbtqia+fóbica, capacitista, gordofóbica, genocida climática, em que opressões atravessam, cotidianamente, corpos desde as mais tenra idade.

Ao mesmo tempo em que essas questões estruturais, que não vêm de hoje, se tornam mais evidentes, temos também uma conexão cada vez maior por meio das redes sociais. A geração Z tem tanto acesso a informação quanto jamais se viu nas gerações anteriores. Enfrentamos mudanças com uma rapidez jamais vista e a informação tem um papel de centralidade nesse âmbito - sendo fonte de empoderamento coletivo, mas, ao mesmo tempo, propiciando níveis de ansiedade pouco experienciados nas décadas passadas.

As respostas para a questão da saúde mental entre as juventudes são complexas e não estão dadas, mas há de se pensar sobre os caminhos para a construção de um mundo em que crianças, adolescentes e jovens tenham condições plenas para viverem de maneira saudável, em todas as esferas de nossa existência: física, mental, emocional, espiritual, social, intelectual e ambiental. Inspirar-nos em filosofias indígenas, como o Sumak Kawsay (Bem-viver), desenhando outras possibilidades de mundo em que o adoecimento psíquico deixe de se tornar regra. Projetos como a Rede Autoestima-se, idealizada pela jovem Mariana Nunes, são outros exemplos inspiradores.

Para finalizar a coluna de hoje, compartilho um poema escrito nos meus dias difíceis, em que a palavra me acalantou para seguir escrevendo essas outras histórias de vida coletiva possível. Que todes jovens tenham a possibilidade de se expressarem e se sentirem acolhides na escola, universidade, família, serviços de saúde e em todas as esferas possíveis da sociedade.

todas pequenas fases da lua

você sabe como é se sentir crescendo dentro de si mesma?

a sensação de expansão nas costas, que se confunde com o estresse acumulado dos dias

sobre os ombros, encaixes do pescoço e

na verdade percebo que são meus ossos, estremecendo para fora do meu próprio alcance

 

os 22 têm peso de 64 em um mundo que me parece já no fim

e eu ainda tão no começo

toda uma vontade de comer o mundo, mas o medo de que ele não esteja aqui quando chegar a minha vez

 

crise climática, econômica, social, humanitária, pandemia, migratória, aquosa, todas na minha vez de ser jovem

eu quero assistir pequena sereia

 

eu quero fechar os olhos, acreditar em fadas e acreditar que tudo vai ficar tudo bem

eu pragmática, porém mística e otimista

busco referências no meu próprio passado para continuar seguindo esse destino sem

 

as iluminações de um outro tempo

que engoliu o sentido da vida esquecendo que o futuro deveria ser um bem coletivo

 

eu tenho escrito poemas como quem chora cartas de despedida pro mundo

mas querendo reatar nossa relação [não é sobre mim, estarei sentada na primeira fila do cinema até que o filme da humanidade se finde

comendo pipoca

e me perguntando

como chegamos até aqui]

 

não é sobre mim, mas sobre nós

e eu realmente gostaria (e acredito) na reabilitação antes do fim dos tempos, da pausa do fim do mundo já instaurado

o mundo se acaba há tantos séculos

mas cá estamos nós

 

dançando para os céus buscando reavivá-lo.

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